Inaptidão ao amor

Gostaria de poder amar.
Almejo experimentar a saudade e
O gosto da boca no reencontro.
A saudade que banha os pensamentos sinestésicos,
Que permeia um dos cantos mais deliciosos e bem vividos da lembrança.
Anseio por um enredo bem sucedido de um amor apaixonado,
Como carnaval cujos corpos dançam grudados no emaranhado de gente
E de sorrisos daquela felicidade que parece que vai ser eterna.
O amor que deita num colchão de rosas cheirosas e macias como minha pele foi um dia.

No lugar disso, uma distinta inaptidão para demonstrar o bem-querer,
para conjugar meu dia com o da pessoa amada.
Minha casa é a solidão cujo silêncio do burburinho que toma conta dos pensamentos me serve de companhia;
Aqui é minha paixão,
Este é o amor que conheço:
O coração que acelera não pelo avistar da pessoa amada e sim pela iminência da chegada e esperada solidão.
A boca que beija o ar apenas inalado por mim mesma;
Os olhos brilhando ao fitar não o semblante do querido,
Mas das páginas do livro sobre a guerra;
O cabelo tocado com carinho por alguém que partiu há muito,
Agora se entrelaça apenas nos dedos da alma que agora escreve,
A poesia visceral de amor escrita para ninguém
A não ser a mim mesma com a lembrança de não ter escrito a pessoa alguma.
Sim, ninguém vai ser minha melhor companhia esta noite!
Meu amor declarado à solidão...

Camila Oleski

Dores n'alma

Capaz de dizer que coisas que não importam
Estou cheia, cheia de inutilidades e inutensílios (como diria o poeta)
Lotada de invivências, inexperiências
Sou aquela que faz chorar o coração
Sou a mágoa latente no coração do infeliz
Sou a rosa que, na mão dos distraídos, fura-lhes o dedo
A amargura no coração de quem foi desprezado
A nota zero do aluno
Sou o tumor que cresce e suga a vida que estava sendo bem aproveitada
E que chega para desiludir e destruir
O caixão que é levado no cortejo e que carrega quem jaz, querido
Sou a lágrima que cai dos olhos enfurecidos
A pétala que, seca, se desprende da flor quando chega o outono
O buraco na barriga do angustiado
Sou a crise existencial do suicida
Sou a podridão da humanidade
A torpeza que rouba a dignidade
Sou a lama que os miseráveis famintos comem para enganar a fome
Os destroços que restaram depois do tufão
Ou aqueles encontrados depois da catástrofe
Da queda do avião, do naufrágio, do capotamento do carro
Aquilo que já foi usado e que agora é lixo
Sou o que foi deixado de lado
O sapato fedido e gasto do mendigo que caminha sem destino
Sou o nó na garganta daquele que queria gritar, mas não lhe é permitido
Sou o soco na cara do oprimido
A lembrança esquecida naquele que queria construir uma história de vida significativa
A sobra de comida rejeitada pelo estômago empanzinado
A ignorância do povo
A mentira que manipula a massa de manobra
O senso comum que aliena o cidadão
O barulho que não deixa o trabalhador dormir depois de um dia cansativo
O suborno
O estupro
A propina
A palavra que ofende
A chibatada
A tortura
A dívida
O roubo
O vil

Camila Oleski



A última notícia

A última notícia que tive de mim foi de você  Que me disse que eu havia me perdido  E que achava que eu não podia ir tão longe Mas fui ...